segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Leandro Gomes de Barros

140 ANOS DE NASCIMENTO DE LEANDRO GOMES DE BARROS, o rei da Literatura de Cordel.

Comemora-se este ano os 140 anos de nascimento de Leandro Gomes de Barros, o maior expoente da Literatura de Cordel. O poeta nasceu na fazenda Melancia, em Pombal-PB, no dia 19 de novembro de 1865 e faleceu em Recife-PE, no dia 4 de março de 1918, segundo alguns pesquisadores, vitimado pela Influenza espanhola. Era sobrinho materno do padre Vicente Xavier de Farias, que ajudou a criá-lo. Por causa dos maus tratos que o padre lhe infligia, fugiu de casa aos 11 anos, tendo passado muitas privações. Qualquer semelhança com a história de Cancão de Fogo e Alfredo, personagens criados pelo mestre de Pombal, talvez não seja mera coincidência...

"Fui um menino enjeitado
Fui triste logo ao nascer
Nem uma ave noturna
Tão triste não pode ser
Eu sou igual ao deserto
Onde ninguém quer viver.
Esse homem que me cria
Me maltrata em tal altura
Que nem um preso no cárcere
Sofrerá tanta amargura
Não foi Deus, é impossível
Que me deu tanta amargura."

(Trechos de "A Vida de Cancão de Fogo e seu Testamento", que narra o encontro de
Cancão com o seu colega Alfredo).

Leandro residiu até os 15 anos de idade no Teixeira, na Paraíba (berço dos grandes cantadores do passado), tendo se mudado após esse período para Vitória de Santo Antão-PE, onde casou-se com dona Venustiniana Eulália de Barros, com quem teve quatro filhos, segundo apurou a conceituada pesquisadora Ruth Brito Lemos Terra em sua obra "Memórias de Lutas: Literatura de Folhetos do Nordeste - 1893 - 1930". Os filhos de Leandro eram Rachel, Erodildes (Didi), Julieta e Esaú; este último seguiu a carreira militar, tendo participado da Revolução de 1924 e da Coluna Prestes. Durante as pesquisas realizadas para elaboração de sua obra, Ruth Terra conseguiu entrevistar Julieta Gomes de Barros, uma das filhas de Leandro. Um dos filhos, Esaú, assinou juntamente com mãe o documento de venda da obra de seu pai ao poeta João Martins de Athayde, em 1921.
Estima-se que a vasta produção literária de Leandro, iniciada em 1889, no estado de Pernambuco, atinge cerca de 600 títulos, dos quais foram tiradas mais de 10 mil edições. Entre 1906 e 1917 foi proprietário de uma pequena gráfica - a Typografia Perseverança - destinada exclusivamente à impressão e distribuição de seus próprios folhetos, tendo vendido o seu prelo ao amigo Francisco das Chagas Batista, da Popular Editora, em função de suas muitas viagens e pouco interesse dos filhos (ainda pequenos) pelo ofício de tipógrafo. Após a sua morte, em 1918, seu genro Pedro Batista (irmão de Chagas Batista e esposo de Rachel Aleixo de Barros, filha de Leandro), continuou editando a sua obra em Guarabira-PB, fazendo algumas revisões de linguagem. Na 3ª edição completa de "O Cachorro dos Mortos", um dos maiores clássicos de Leandro, publicado em Guarabira-PB em 1919 (um ano após a sua morte), Pedro Batista colocou o seguinte aviso:
"Tendo falecido o poeta Leandro Gomes de Barros passou a me pertencer a propriedade material de toda a sua obra literária. Só a mim, pois, cabe o direito de reprodução dos folhetos do dito poeta, achando-me habilitado a agir dentro da lei contra quem cometer o crime de reprodução dos ditos folhetos."
Ainda na contracapa do dito folheto, Pedro Batista dá nome aos "bois" responsáveis pela "pirataria":
"Já achava-se este folheto em composição quando chegou ao meu conhecimento que em Belém do Pará, um indivíduo de nome Francisco Lopes e no Ceará um outro de nome Luiz da Costa Pinheiro, têm criminosamente feito imprimir e vender este e outros folhetos do poeta Leandro Gomes de Barros, sem a menor autorização de minha parte que sou o legítimo dono de toda a obra literária desse poeta. (...)"
Ora, bem pior fez João Martins de Athayde, que após adquirir por compra o espólio de Leandro, tentou usurpá-lhe a autoria suprimindo o seu nome da capa dos folhetos e alterando os acrósticos que Leandro utilizava no final dos poemas, a fim de confundir a identificação. Essa prática condenável verifica-se em dezenas de obras reeditadas por Athayde. Vejam só o que aconteceu com a última estrofe do folheto "A Força do Amor ou Alonso e Marina", onde o acróstico LEANDRO foi alterado para IEANJRO:

Folheto editado pelo autor:
Levemos isso em análise
Então ver-se-á onde vai
A soberba é abatida
No abismo tudo cai,
Deus é grande e tem poder
Reduz ao pó qualquer ser
O poder dele não cai.
Versão de João Martins de Athayde:
Isto fica como exemplo
Então ver-se-á onde vai
A soberba é abatida
No abismo tudo cai
Jesus é grande em poder
Reduz ao pó qualquer ser
O poder Dele que é pai.

A venda dos direitos autorais de Leandro Gomes de Barros, pela viúva do poeta, Dona Venustiniana Aleixo de Barros, a João Martins de Ataíde ocorreu em 1921. O pesquisador Sebastião Nunes Batista, que muito se empenhou pela restituição de autoria de Leandro e de outros poetas populares, informa como se deu essa transação, em artigo intitulado "O seu ao seu dono..." publicado na revista Encontro com o Folclore (Rio de Janeiro, 5 de abril de 1965):
"D. Vênus, como era chamada na intimidade, desentendera-se com o seu genro Pedro Batista, porque tendo este enviuvado de sua filha Rachel Aleixo de Barros, que faleceu de parto da pequena Djanane, não concordou em que a menina fosse para companhia da avó materna, e esta em represália autorizou João Martins de Athayde a editar parte da obra literária do grande poeta popular paraibano Leandro Gomes de Barros."
Escreveu folhetos de cordel de grande aceitação popular, como O Cachorro dos Mortos, Branca de Neve e o Soldado Guerreiro, Batalha de Oliveiros com Ferrabrás, Peleja de Riachão com o Diabo, História da Donzela Teodora, Juvenal e o Dragão, Antônio Silvino, o Rei dos Cangaceiros e O Boi Misterioso. Pioneiro na produção de literatura de cordel no país, Leandro Gomes de Barros foi considerado por Luís da Câmara Cascudo "o mais lido de todos os escritores populares. Escreveu para sertanejos e matutos, cantadores, cangaceiros, almocreves, comboieiros, feirantes e vaqueiros. É lido nas feiras, nas fazendas, sob as oiticicas, nas horas do 'rancho', no oitão das casas pobres, soletrado com amor e admirado com fanatismo. Seus romances, histórias românticas em versos, são decorados pelos cantadores".

LEANDRO POR ELE MESMO
A cabeça um tanto grande e bem redonda,
O nariz, afilado, um pouco grosso;
As orelhas não são muito pequenas,
Beiço fino e não tem quase pescoço.
Tem a fala um pouco fina, voz sem som,
De cor branca e altura regular,
Pouca barba, bigode fino e louro.
Cambaleia um tanto quanto ao andar.
Olhos grandes, bem azuis, da cor do mar;
Corpo mole, mas não é tipo esquisito,
Têm pessoas que o acham muito feio,
Sua mãe, quando o viu, achou bonito!

Não se sabe ao certo o número de histórias que escreveu. Estima-se que foi autor de mais de 600 obras, das quais, pelo menos umas 50 são verdadeiros clássicos do gênero.
UMA PENA EM DEFESA DOS OPRIMIDOS
O poeta e pesquisador Permínio Ásfora também escreveu sobre Leandro: "(...) Trechos de sua vida são lembrados ainda hoje. Contam que já morava no Recife quando um senhor de engenho, indignado com um morador, resolveu aplicar neste uma sova de palmatória (...) Um dia o senhor de engenho é surpreendido por violenta punhalada vibrada pela mesma mão que levara seus bolos". E segue informando que Leandro aproveitando a fato descreveu o folheto "O Punhal e a palmatória" , publicação que o levou à prisão pelo chefe de polícia. Ásfora informa que: "...apesar de folgazão, Leandro era homem de muita vergonha e de muito sentimento. E que naquele já distante ano de 1918 a cadeia constituía uma humilhação, à humilhação da cadeia sucumbiu o grande trovador popular". Tudo leva a crer que Leandro veio a falecer vítima desse inconveniente. Eis a primeira estrofe do folheto questionado:
"Nós temos cinco governos
O primeiro o federal
O segundo o do Estado
O terceiro o municipal
O quarto a palmatória
E o quinto o velho punhal".